4.5.09

Manifesto contra a caretice

| Chamuscado por Laritz |


Quando eu era criança, imaginava que a chegada do ano 2000 inauguraria uma era de tanta tecnologia que teríamos a impressão de viver dentro de uma bolha de ficção científica. Carros seriam espaçonaves. Trabalhadores seriam substituídos por robôs. Doenças não existiriam mais. Pílulas forneceriam a carga nutricional diária. Tudo seria automatizado, inclusive as pessoas - todas elas plastificadas. Mas o Século 21 despontou, o mundo não acabou, e continuamos padecendo dos mesmos males. Uma simples gripe se transforma em perigosa pandemia, como há quase cem anos. Pessoas morrem de fome, de pestes, de ignorância. A violência toma de assalto as ruas. A informatização se espalha, porém ainda não consegue desburocratizar setores essenciais. Enfim, a impressão é que os anos se sucedem e tudo continua igual.

É claro que houve incontáveis avanços, especialmente novos medicamentos, pesquisas genéticas e telecomunicações. Nos anos 80, por exemplo, ninguém imaginava falar com o outro lado do mundo em segundos por meio de um aparelhinho sem fio. Contudo, apesar de tanto desenvolvimento, sofremos alguns retrocessos, especialmente nos relacionamentos, que se tornam mais inconsistentes dia após dia. E, nesse atraso comportamental, uma das coisas que mais me incomoda é a onda do politicamente correto. Por que as pessoas hoje se preocupam com coisas tão pequenas? É feio falar tal palavra, é incorreto fazer tal coisa, é perigoso comer tal guloseima, não pode isso, não pode aquilo... No passado, pelo menos existia o protesto. Hoje, os humanos vestem seu conservadorismo e engolem quietos tudo o que mídia e governos empurram goela abaixo. Será que todos esperam passivamente o dia em que será proibido pensar?

Nesse embate entre o bem e o mal, houve época em que o ovo era o vilão malvado. Ingerir dois ou três por semana era assinar atestado de morte por infarto. Agora, pesquisas indicam que o risco não é tão grande, afinal a culpa de todos os males recai sobre as chamadas gorduras trans. A lista de perigos engrossa a passos largos: não podemos mais beber, fumar, comer junkie food, ter rugas, celulites ou estrias, namorar livremente, brochar em paz, comprar coxinha na cantina, ir à praia sem protetor solar, palitar os dentes, viajar de avião sem máscara... E para piorar ainda mais essa neurose coletiva, foi lançado adesivo que monitora as calorias ingeridas e apita se você comer um pedacinho a mais daquela tentadora barra de chocolate. Querem nos transformar em bonecos de plástico que consomem tudo o que for ofertado para ter status e preservar a saúde e a juventude, anulando o que temos de mais importante: o cérebro e o livre pensar. O policiamento anda tão ferrenho que daqui a pouco haverá lei regulamentando o uso de preservativo. Dá até para imaginar a cena nada romântica: um bando de fiscais burocratas invadindo uma suíte de motel para multar o casal que esqueceu de incluir a borracha nas suas relações.

E o que mais espanta é observar que todo esse incentivo à eterna juventude e à saúde perfeita caminha acompanhado do estímulo ao consumismo desenfreado. Pior ainda é o apoio à abominável prática do dedo-durismo. Pois é com os préstimos dos alcaguetes de plantão que os governos contam para levar a cabo a fiscalização de quem faz xixi fora do penico, algo que remete diretamente aos tristes anos de chumbo da ditadura. Diante desse terrível cerco de imposições e proibições, eu questiono: o mundo encaretou ou é apenas uma sombria impressão? Será que o tempo passa, o mundo gira e no final continuaremos sempre cantando aquela velha canção de Roberto Carlos: "Tudo que eu gosto é ilegal, é imoral ou engorda"?

3 comentários:

Blog Dri Viaro disse...

e eu que pensava que os carros iriam voar rsrs
bjsss

Julio Sonsol disse...

para alguns, o presente está bem próximo do que vc imaginou. Mas nunca se teve tanto miseráveis como agora.

Mosana disse...

família jetsons eram meu sonho de consumo!!!!
ao menos fugiríamos do trânsito!!!
mas eu adoro essa canção do roberto!
kisses

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